Opinião

Inserção de Armazenamento de Energia no contexto das Energias Renováveis

Não é mais hora de falar sobre a viabilidade destas tecnologias nem sobre premissas de redução de preços, o mundo alcançou alto grau de amadurecimento em tais alternativas e o descrédito nos levou a mais de década de atraso

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Mais uma vez estamos convivendo com situações de risco de abastecimento em diversos locais no país.  A crise energética do estado de Roraima é reflexo de um descuido enorme do Brasil frente aos desafios e na introdução planejada de novas alternativas para o setor elétrico. Se a energia elétrica pode ser vista no país como um indicador social, podemos entender a expectativa da sociedade neste quesito. Neste sentido desenvolvemos uma pirâmide de hierarquia das necessidades, usando como referência o estudo de Maslow. Hoje os consumidores brasileiros convivem com um sistema elétrico de custo alto e, assim, as suas tarifas, bem como com nível sofrível de confiabilidade e qualidade. Continuamos a debitar aos fenômenos naturais todo o caos da falta de energia gerada pela água, às tempestades que nos assolam em termos de falta de confiabilidade e de resiliência dos sistemas e convivendo com um processo complexo de mitigação de riscos com bandeiras de aumento tarifário sem a ampla percepção do consumidor sobre o assunto.

Como em Roraima, passamos anos discutindo interligações, limitando a expansão do sistema por contenção do aumento de tarifas e encargos e continuando a usar o óleo diesel indiscriminadamente para geração de energia. E, acreditemos, o mesmo óleo diesel é usado para reduzir o custo de energia de ponta do sistema em unidades consumidoras. Convivemos com cerca de 246 sistemas isolados no Brasil, espalhados em oito estados, usando tais térmicas, sendo boa parte destas usinas sem atendimento durante as 24 horas do dia. Só em Roraima, e só no Sistema Eletrobrás, temos 143 usinas movidas à óleo diesel, de acordo com relatório do Grupo Técnico Operacional da Região Norte da Eletrobras (dados de 2016).

A sociedade brasileira se vê no mais baixo nível de uma escala de expectativas, preocupada em ter energia (como Roraima e localidades isoladas) e em debate contínuo com custo e confiabilidade de suprimento (vide figura).

Sempre, tomados por sustos e movidos por soluços, tentamos ações pontuais. Depois de se ter resultados extremamente positivos na implantação de alguns sistemas híbridos, com baterias, e para armazenamento de energia no Brasil o Governo Brasileiro tomou a iniciativa, ainda que tímida, de tentar promover o uso de soluções híbridas no leilão próximo para Roraima. Mas, sejamos razoáveis, a promoção de um leilão onde as questões de logística, necessidades urgentes para eletrificação e interligação do sistema de transmissão e o problema permanente com a interligação com a Venezuela já nos levam a reconsiderar que uma ação de curto prazo de novas tecnologias será a solução para os próximos meses.

Em diversos locais já encontramos, instalados e operando há anos, sistemas híbridos de fonte fotovoltaica com baterias. No Havaí, por exemplo, tais fontes concorreram, já há alguns anos, em custos muito menores do que qualquer outra solução. Os mesmos sistemas são usados na África, para atendimento de comunidades isoladas, bem como na Ásia ou América Central para diversos tipos de atendimento, incluindo hospitais ou pontos estratégicos em países, como Haiti. Os leilões de energia híbrida, no Colorado, ainda recentes, onde para cada duas unidades de geração solar se acrescentava uma unidade de armazenamento de energia em bateria, levou a um preço de 30 dólares por Mwh gerado! A ABAQUE tem insistido que as novas tecnologias despontam como comercialmente competitivas e geram inúmeras oportunidades de soluções para fornecimento de energia mais barata e com confiabilidade. Enquanto, no Brasil, continuamos queimando óleo diesel para a geração de energia elétrica, diversos projetos, em diferentes tecnologias de sistemas híbridos, tomam forma em países desenvolvidos ou não, movidos pela procura de soluções que atendam questões ambientais, de custo e de confiabilidade.

A ABAQUE tem trabalhado para mostrar que a união das tecnologias e formas comerciais em energias renováveis, junto com uma política consistente de governo em termos, não só de planejamento energético, mas no desenvolvimento de uma indústria forte de armazenamento pode constituir em um grande vértice no novo modelo para o Setor Elétrico Nacional. Em um momento em que o mundo se prepara para a colocação maciça de “baterias residenciais” o Brasil mal se prepara para a adoção de sistemas híbridos de grande porte, prática que pode ser vista em centenas de lugares do mundo.

Não é mais hora de falar sobre a viabilidade destas tecnologias ou sobre premissas de redução de preços de tais tecnologias. O Brasil passou ao largo do desenvolvimento das usinas reversíveis que ocupam cerca de 180 GW no mundo, desconsiderou o desenvolvimento das diversas tecnologias de acumulação de energia, sejam baterias ou calor/frio. O mundo alcançou alto grau de amadurecimento em tais alternativas e o descrédito, no país, em novas solução nos levou a mais de década de atraso em soluções para o Setor Elétrico Nacional.

Nossos problemas se acumulam, quer seja o do atendimento de Roraima ou nas outras localidades isoladas. Sofremos com a falta de alternativas em sistemas ancilares para o grid e existe forte demanda por confiabilidade em microrregiões ou em unidades consumidoras, como hospitais ou, até mesmo, para se ter soluções limpas e baratas para o atendimento de ponta de consumo.

As opções em sistemas híbridos, com armazenamento de energia e considerando inúmeras tecnologias já estão presentes no Brasil. Diversas empresas brasileiras desenvolvem tais alternativas e clamam por condições claras para competir em igualdade no mercado. Para o Brasil já não basta mais o corajoso desbravamento feito pelos empreendedores em energia, que conseguiram mostrar a viabilidade das mesmas face à incredulidade, desconhecimento do assunto e da falta de política industrial brasileira para tais tecnologias. Agora, o Brasil está envolvido em um contexto diferente. O consumidor precisa de baixo custo de energia, a sociedade precisa de alternativa eficiente e barata. Estudo de mercado feito pela ABAQUE, em 2017, mostra um potencial de aplicação imediata de cerca de 100 GW em armazenamento de energia junto com fontes renováveis.

Agora torna-se necessário que se vençam desafios que permitam os sistemas híbridos oferecerem soluções concretas e comercialmente competitivas para o mercado brasileiro. Para tanto é hora de tomar atitudes em:

  1. Promover políticas de planejamento em conjunto com políticas industriais que permitam o uso de tais tecnologias em condições comerciais competitivas no Brasil.
  2. Criar, com urgência, regras e procedimentos comerciais e regulatórios justos que permitam a competição destas fontes em toda natureza de processos de geração e de serviços ancilares para aplicação imediata no Setor Elétrico Nacional.
  3. Promover a inserção de tais tecnologias usando os resultados da Chamada do P&D Estratégico 21, divulgando seus resultados para todos os agentes envolvidos em tais tecnologias.
  4. Promover competitividade justa nos quesitos de logística, prazos de contratos de comercialização e critérios de fornecimento, para que os sistemas híbridos possam ser colocados com opção para todos os tipo de leilões de fontes de geração de energia e no atendimento de localidades isoladas a preços menores e com qualidade e continuidade de fornecimento.
  5. Considerar com urgência regras e mecanismos que promovam o uso de sistemas híbridos em unidades consumidoras de média e baixa tensão, pelo menor custo e maior confiabilidade.

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